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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Última parte de meu conto: Matou a família e foi ler o jornal do dia



- Vamos entrando e se acomodando, vou fazer uma macarronada deliciosa – disse a mãe.

Sete e meia da manhã e nada do jornal. Muitas coisas começaram a passar pela cabeça do velho: O jornaleiro está morto; foi sequestrado; atropelado e está em coma com meu jornal nas mãos; foi abduzido; filho da puta! Está na esquina da rua, rindo de todo o transtorno que está me causando.

Pensou em levantar e ir até a esquina, mas antes de conseguir realizar suas vontades, o genro chega e senta-se para puxar conversa.

- Como vai sogro?
- Não muito bem.
- É o jornal?

Ele sabia que era o jornal, então porque estava perguntando se toda aquela situação estava sendo causada pelo jornal, ou melhor, pela falta dele.

- Se eu soubesse que seu jornal não havia chegado...

O genro foi interrompido pelo levantar rápido do sogro, o jornal acabara de chegar e, como um investigador criminal, José interrogou o jornaleiro com todo afinco.

- E que isso não aconteça mais – dizia José, enquanto o jornaleiro tentava se explicava.

Já era quase oito horas, os vizinhos que sempre acordavam mais tarde aos domingos resolveram despertar mais cedo. Carros sendo tirados, para serem lavados, garotas com seus micro-shorts passeando com seus cães, mas o velho José, só queria saber de uma coisa. Ler o seu jornal de domingo. Não havia tempo para afinidades com vizinhos.

Começou a tirar o jornal do saco plástico, quando chegaram os netos querendo atenção.

- Vô! Vô! Vamos brincar!

O velho não queria saber de brincar, só queria ler seu jornal.

- Outra hora. – respondeu secamente.

As crianças ficaram tristes, saíram de cabeça baixa. O genro não gostou muito e como desforra, ficou determinado a não deixar o velho ler o jornal.

Enquanto o senhor José tentava abrir o pacote, seu genro não parava de falar, falava do trabalho, de seus projetos e de um bate boca que teve com um mestre de obras.

- José, o que você fez com os meninos – falou a esposa, chegando sorrateiramente.
- Não fiz nada.
- Os meninos vieram, hoje, para passar o dia com agente e será que você não pode dar um pouco de atenção a eles?
- Me deixa ler o Jornal, que nos brincamos depois.
- Três horas de viajem para isso, José.

Eram duas horas de viagem e não três – Porque mulher faz drama em tudo – pensou.

Os garotos começaram a chorar e, foi aí que, a esposa teve a idéia mais estúpida da humana. - Não vou deixar esse rabugento ler essa porcaria de jornal de domingo.

José pediu licença ao genro e foi para o quintal, tentar ler as notícias, pegou uma das cadeiras do terraço e foi para uma sombra, que um pé de carambolas proporcionava todas as manhãs em seu terreno.

- Vamos fazer de tudo para ele não ler o jornal de hoje – falava a sua companheira, enquanto a sogra da filha morria de rir.

- Mamãe, deixa o pai ler o jornal dele, o coitado depois que se aposentou, só tem essa diversão.
- Hoje ele não lê esse Jornal – foi relutante.

O cheiro do jornal era ótimo, apesar da hora que chegara, ainda tinha cheiro de jornal novo, as notícias ainda eram fresquinhas, pelo menos para José. Só que o homem não sabia do plano que estavam armando por suas costas, nem quem seria a autora intelectual dos atos que se sucederam. E assim, o plano foi posto em prática, era menino correndo, brincando de paga, gritando, destruindo o equilíbrio natural das coisas. A filha vinha a cada 10 minutos, com fotos antigas, para rememorar os tempos de glória, a empregada que perguntava qualquer bobagem e o genro que com a cara mais sínica, reclamava com os moleques, mas estava se deliciando com o caos. Um inferno! Estou no infernou – pensou o castigado homem.

José, não se sentia tão estressado desde os tempos em que tinha que acordar, todos os dias, às quatro e meia da manhã e pegar um trânsito infernal para poder ir ao trabalho. Sentiu saudades.

Sempre que iniciava a leitura, uma interrupção. Do primeiro cadernos viu só a charge, do caderno internacional, apenas o nome: Internacional; cultura, apenas o título: Furacão Baiano faz show inesquecível. Foi quando o genro teve a excelente ideia de falar que Leonel Messi fora escolhido pela terceira fez o melhor jogador do mundo, aquilo era inadmissível, o caderno de esportes era sagrado para qualquer homem, até seu genro sabia disto

José o olhou, no fundo da alma, o genro se sentiu nu, colocou as mãos no peito, como que tentando esconder sua nudez e entrou na casa desconfiado.

- Acho que excedemos os limites – falou ao entrar na cozinha.

José, foi até a garagem, pegou um facão, que havia amolado para poder podar o pé de carambolas mais tarde, entrou em casa e começou seu ritual. Gritos podiam ser ouvidos pelos vizinhos, que começaram a se aglomerar enfrente a casa. – Não vovô, vovô – gritavam os moleques e José respondia: - Querem jogar bola!? Vão jogar, agora, no raio que os parta!
Tudo durou pouco mais de vinte minutos. José saiu da cozinha e o que deixou para trás foram, pedaços de corpos, vísceras, sangue e a cabeça de seus familiares em cima da mesa, com a exceção da cabeça do genro que, havia sido jogada no balde de lixo, até a emprega ganhou um lugar em cima da mesa, pois prestavas bons serviços para a família a mais de vinte anos.

O homem parecia estar cansado, mas com um semblante sereno. Passou a mão no rosto, para limpa um pouco do sangue que lhe untava todo o corpo, foi até o quintal, sentou-se e depois de ter cometido seu ato de selvageria e libertação, pegou seu jornal, com toda a calma do mundo, procurou os classificados, em busca de um emprego, pois precisava complementar a renda da família e não aguentava mais toda aquela ociosidade que a aposentadoria lhe causara.

- Como pode um aposentado sobreviver neste País? – pensou, ao ver o aumento que o governo deu a sua categoria e, finalmente conseguiu matar a vontade de ler seu jornal dominical.

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