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quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Um trecho de meu livro, que estou reescrevendo: Lugar Nenhum Paraíso Distópico



Seis horas da manhã, o despertador acha que me acorda, mas dessa vez o enganei. Passei à noite toda em claro, pude ouvir todos os sons da madrugada, alguns foram bem assustadores, no entanto, o silêncio me incomodou bem mais, pois me dava à sensação de impotência e incerteza que os rumos de minha vida estavam tomando.

– Lázaro! Lázaro! Já são seis horas! Acorda Cinderela – gritava Tio Paulo da escada, errado dessa vez por achar que eu iria me atrasar como o de costume, pois dessa vez já estava de pé e sem nenhum sono – apensar de não ter dormido direito.

– Já sei Tio, tô indo! – gritei do quarto pegando uma tolha.

Vou ao banheiro, tiro toda a roupa, mas mesmo assim me sinto vestido, me olho no espelho do banheiro “Não sou mais um menino”, penso, ao ver minha barba por fazer. Apesar de ter pouca idade, minha barba já era completa e mesmo sendo rala não tinha uma única falha.

Abro o chuveiro – nada como uma boa ducha fria para desperta todo o corpo – ao me molhar volto a sentir um queimor, agora bem mais desconfortável, em minhas costas, estico o braço e toco onde está ardendo, percebo algo, uma protuberância, uma espécie de cicatriz, como se eu tivesse me arranhado em algum lugar. Saio do banho, tento ver no espelho o que é – é uma cicatriz de mais ou menos quatro centímetros na parte direita de meu dorso, lembra um arranhão feito por uma unha, “Teria sido Ainá?”, me questiono. Não podia ter sido ela, pois a cicatriz parecia estar cauterizada.

– Vou terminar ficando louco – digo para meu reflexo e ele apenas me olha – Será que estou louco ou apenas sonhado? Se for um sonho alguém tem que me acordar.

Penso em me beliscar, aproximo os dedos do braço... E se não for um sonho, se tudo isso pelo o que estou passando for real?

Você já sentiu como se estivesse acordado, mas com a sensação de estar em um sonho? Pois bem, é assim que tenho me sentido ultimamente. E se eu tiver morrido? E se eu estiver em coma e esse beliscão puder me fazer despertar? Não, não, não! Sempre que vejo pessoas sorrindo para mim elas estão tão felizes, mas se tudo só for aparência, se tudo for à ponta de algo tristemente maior... O que posso fazer? Nada posso fazer só esperar que esse tal de Gildo me diga algo que acabe com tudo esse pesadelo.

– Lazaro! Vai morar ai é menino! – os gritos de Tio Paulo me tiram do transe tempestivo, mas a sensação de estar vivendo um sonho não passa por completo. 

Termino de tomar banho, sem coragem de me beliscar e ter certeza de alguma coisa.         
            
(...)

Marcos Martins.

domingo, 3 de novembro de 2013

Mais um filho que nasce. Trecho de mais um de meus livros: "A democracia dos derrotados"


  

(...)
 
- Você agora acha que é escritor, Roger? – perguntou Soluço com sarcasmos na voz.
 
- Não, não sou - respondeu Roger ao que deixou todos surpresos.
 
- Não? – entoaram em coro, quase como um mantra, todos os que lhe conheciam e estavam no inferninho.
 
- Não acho... Eu sou escritor. – ao que respondeu Roger com força e impostando a voz.  
 
Fez-se um silêncio sínico por algum tempo e logo em seguida, gargalhadas debochadas e risos com escárnio criaram um eco tão forte no local, que até quem não ouvira Roger responder a provocação começou a sorrir. Ele retraiu os ombros e curvou-se, criando uma elevação na camisa que dava a entender que tinha uma corcova enorme em suas costas, foi então que a sensação de que a vida lhe tirara tudo, até o direito de sonhar, havia sido implantada em seu coração.
 
(...)
 
Marcos Martins.